quinta-feira, 1 de abril de 2010

Coluna Cinema - por João Paulo Teixeira

A metalinguagem da loucura



Quando duas genialidades se encontram, na maioria das vezes, a humanidade ganha uma obra para a posteridade. É o que acontece em Crepúsculo dos Deuses (Sunset Boulevard, 1950) com o diretor austríaco Billy Wilder e a atriz Gloria Swanson. Ela, nascida para o papel, vive a estrela do cinema mudo Norma Desmond e suas esperanças débeis de subir pela última vez ao Monte Olimpo.

Como toda celebridade em busca do derradeiro estrelato, Norma se agarra ao ordinário roteirista Joe Gillis numa trama que beira a insanidade. Alheia as rotações da indústria do sucesso, a personagem é a metáfora de carne daqueles que não sabem respeitar os limites do tempo. Gillis, seu alter-ego, forma com ela um par esdrúxulo que inspira pena e raiva desde o momento que ele chega foragido a mansão Boulevard.

Wilder, ao mesmo tempo, sabe conduzir o filme como Shakespeare faz com Rei Lear numa das tragédias mais representadas do ocidente. Ele direciona a sana de Norma diretamente ao módulo de produção de Hollywood. Fazem parte desta composição, os “atores” cineastas DeMille e Hedda Hopper e o roteiro abriga referências desde o pioneiro Griffith até aos já monumentais estúdios de cinema.

Desta maneira, o diretor judeu que chega aos Estados Unidos sem sequer falar inglês, ataca fortemente a roupagem industrial da sétima arte. Em plena ascensão cultural e econômica do país mais rico do mundo, Wilder mostra na atuação de Norma Desmond a degradação emocional resultante daquela epopéia na frente e atrás das câmeras.

Dentro da obra, a transição para a linguagem falada é o mote de Wilder para denunciar a situação deprimente dos novos artistas e, ao mesmo tempo, serve é o plano de fundo da perdição de Norma. Exatamente como ela se intitula, em uma das muitas densas frases do filme. “Eu sou grande. Os filmes é que ficaram pequenos”.

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