domingo, 10 de abril de 2011

Artigo: Demóstenes no jornal Tribuna do Planalto


Os porquês do Rio

O homem é um animal incerto. O pensamento de Montaigne foi usado por especialistas como resposta para a busca de explicações por parte da imprensa e da opinião pública para o massacre numa escola municipal do Realengo, no Rio de Janeiro, na última quinta-feira. O homem, de fato, é um animal incerto e não existirão explicações suficientes para aplacar a indignação da população – o que não pode é um ministro usar as lágrimas das vítimas como palanque para o proselitismo.

O momento é de lamentar, do luto, de estender nossas orações aos familiares das 12 crianças assassinadas por Wellington Menezes de Oliveira e de tantas outras que ainda estão lutando pela vida nos hospitais. O momento seguinte é de buscar respostas. Não apenas os porquês do que levaram o atirador a cometer tal monstruosidade, mas, principalmente, por que e como ele conseguiu atingir seu objetivo.

E nenhuma dessas respostas é obtida no calor do momento. Não raramente são necessários meses de investigações para levantar apenas alguns “talvez”. A atitude do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, de apontar a venda de armas como responsável pelo atentado na escola do Rio é baixa. O ministro não precisou de investigações, perícias ou ouvir qualquer testemunha – mandou ver lá mesmo de Brasília, entre o café e o almoço: “Tragédias como esta devem ser combatidas com uma política forte de desarmamento” – e completou com a propaganda – “o Ministério da Justiça já tem previsto o lançamento desta campanha neste semestre. É necessário que toda sociedade se engaje para que no futuro o uso de armas não continue a tirar mais vidas de jovens inocentes”.

O oportunismo beira as raias do vil. Ninguém nega a importância do debate. Tampouco alguém espera que um ministro de Estado tenha a capacidade de fazer política diante do sangue de inocentes. Cardozo sabe que existem armas para quem quer e não é simplesmente baixando decretos que elas desaparecerão das ruas. Basta olhar os noticiários: armas de uso exclusivo das Forças Armadas e policiais são encontradas em poder do tráfico com a mesma facilidade que pipoca em festa de São João – mesmo com a venda proibida por Lei. A questão é limitar o acesso para pessoas que realmente necessitem possuir uma. E para resolver isso não basta posar de bom moço diante das lentes da televisão, é preciso barrar o tráfico na fronteira, por onde entra a grande maioria dos armamentos utilizados em crimes.

Não podemos viver no Brasil do horário nobre, do discurso fácil nos momentos de pesar. Temos que encarar cada problema como ele realmente é. A culpa dos assassinatos no Rio de Janeiro não é do proprietário da loja de armamentos ou das informações disponíveis na internet (que a bem da verdade também estão à disposição em inúmeras bibliotecas), nem serão resolvidas com um discurso afiado no momento de dor. Para tudo existe método e, infelizmente, Cardozo mostrou que o dele é aproveitar-se da situação. Não importa o quão imoral seja.

Demóstenes é procurador geral de Justiça e senador

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